Caminhos

Caminhos
Porque não pode haver outra forma senão a de existir tal como somos...

quarta-feira, 21 de julho de 2021

 

Por este Douro acima.

Olhar é bom, saber ver ainda é melhor.

Andamos durante anos alheados, desatentos, imersos em outros mundos que a idade nos impõe. E depois, quando finalmente decidimos estar atentos, acordar e ver à nossa volta, ouvimos a Natureza a pedir-nos um olhar, uma reverência, um agradecimento, uma homenagem. Centro a minha atenção no espaço circundante. O comboio está cheio de gente, mas não me disperso. De pé, entre duas carruagens, num lugar não suposto, encostada à grade de ferro que limita o acesso à escada de saída, sorvo a plenos pulmões a vida, segundo a segundo. Quero sentir o ar veloz a bater-me na cara. Contemplo o espetáculo dos múltiplos verdes e azuis à minha frente, admiro os mistérios da Natureza, calculo as  dezenas de histórias guardadas por estes vales e montanhas, segredos de vidas árduas, traçadas nos meandros da sorte e do destino. São quilómetros de vinhas em socalcos a perder de vista. Íngremes encostas, onde as oliveiras, apoiadas em solos de xisto, também fazem cor. O rio passa largo, sereno e indiferente, a ensinar-nos que a imensidão não é nossa. O silvo da locomotiva 0186, construída em 1925, atroa os ares. As rodas chiam sobre os carris. Das margens, há quem nos acene. Sinto um respeito solene por isto tudo e obrigo-me ao silêncio, como se estivesse no interior de uma imponente e imensa catedral.