JANELAS
Hoje ao passar por uma
rua pacata da minha cidade, detive-me nesta janela. Gosto de janelas, que tal
como as portas, são passagens para o exterior, para o mundo. É por dentro da
minha janela e para lá da minha janela que escrevo e me inspiro. À janela
esperamos ver, com o nosso olhar indiscreto, os interiores das casas, quando
não há cortinas que resguardam dos olhares; vasos com flores, de preferência
sardinheiras de cores fortes; velhinhas a apanhar sol e a observar quem passa;
e gatos, claro! Esta janela deteve-me, não porque deveria ser de madeira, mas
por ter dois gatos, porque gosto de gatos. Ambos amarelos, coincidência que
tornou o quadro mais bonito de admirar. Bati no vidro, para captar os olhos do
mais molengão e vislumbrei um ligeiro abanar da cortina. Alguém me terá visto e
não se mostrou, mas também não me interceptou na indiscrição da foto. Imaginei uma
velhinha bonacheirona e bondosa, a viver sozinha na companhia dos dois gatos
que lhe alimentam a solidão da velhice, com a ausência de palavras amargas de
ingratidão ou cansaço. Imaginei a velhinha sentindo-se prestável para os dois
animais, alimentando-os com ternura e mimo. Uma senhora passou na rua, observou
a minha atitude e logo encetámos uma conversa curta sobre gatos. A senhora
seguiu o seu caminho e cruzou-se com um gato cinzento, sem dono possivelmente, a
julgar pela aparência, que mansamente sentado nos olhava. Na rua não estava
mais ninguém. Segui também o meu caminho, de alma cheia por um momento tão
insignificante, mas tão rico, para mim, de conteúdo.