Caminhos

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Porque não pode haver outra forma senão a de existir tal como somos...

terça-feira, 25 de abril de 2023

 25 de Abril

Passados 49 anos do dia que nos trouxe a ansiada Liberdade, atravessamos um tempo estranho!

É inegável que temos de pensar antes de abrir a boca, sobretudo para não magoar os outros, mas parece-me que neste tempo corrente, inconstante, instável e frágil somos agora obrigados a pensar muito mais que antes. As sensibilidades estão ao rubro e quase tudo é assumido como um ataque às liberdades individuais. Há, por um lado, a liberdade de acusar, sem critério, tudo o que se quer e, por outro lado, a liberdade de expressão condicionada e ao serviço de más interpretações. E os cravos lentamente vão ficando arroxeados! De repente, temos de nos acautelar para falar, para olhar, até para ouvir!

Comemoramos a incontestável liberdade política que conhecemos, admiramos e aplaudimos e que nos deu um sem número de direitos, mas não poderemos jamais esquecer-nos, em primeiro lugar, dos nossos deveres.

Onde acaba a minha liberdade e começa a do outro? Perdemos a capacidade de separar o trigo do joio? Não estaremos, de certo modo, a perder a liberdade? E o bom senso, em que campo de Abril se perdeu?

 



domingo, 9 de abril de 2023

 

Tempo de Páscoa.

Depois das grandes chuvas, o chão cobria-se de flores miúdas e de verde. A geada abandonava as ervas dos passeios de terra e os telhados das casas. A Natureza renovava-se num êxtase de cores pelos prados e as crianças viviam mais felizes, perdendo-se no meio de corridas e gritos. A roupa branca esvoaçava nos varais improvisados de rua, alguma ficava a corar ao sol nos arbustos, espingalhada de vez em quando, com água de um alguidar, pelas mãos diligentes da avó, para que nunca secasse. A roupa era lavada no grande tanque de cimento que servia para os meus banhos, quando o tempo começava a aquecer. Os carros de rolamentos voltavam à rua, precipitando-se a grande velocidade pelas descidas…

Sente-se o cheiro a mirra e a incenso, à medida que o padre abana o incensório na direção dos ramos que levamos à igreja para benzer. A procissão estende-se a perder de vista. Fazemos vénias no meio de oliveira, alecrim, louro, palma, flores e muita cor. Na missa cantamos e nos momentos de silêncio e recolhimento há o respeito em que se pede saúde, paz para o mundo e perdão dos pecados. Há fé nos rostos, algumas lágrimas, esperanças e sorrisos. Harmonizamo-nos. Deus é só um e é para todos.

No Domingo a seguir apanhávamos hastes de ramos de árvores e flores que desfolhávamos para pôr nas entradas das casas. O padre, assim, sabia que podia entrar ali com a cruz para beijarmos. Ouve-se a sineta ao longe, há quem tente adivinhar se está longe ou perto, ou mesmo em que casa já está. Em cima da mesa havia uma laranja, em cima dela cinco escudos e um envelope branco com dinheiro para a igreja. Alguns doces. A toalha era branca e de renda, daquela que a mãe fazia nas tardes longas de domingo. Muitas pessoas acompanhavam o padre e iam de casa em casa, onde se partilhava bebida e comida. O bairro vestia-se com as suas melhores roupas para celabrar a Ressureição de Cristo e das almas.

Era um tempo de interação e amizade em tempo real, de beijos e abraços, de bom-dia, de desculpe, de obrigado e de até já.

Que não se percam os valores!