Tempo
de Páscoa.
Depois
das grandes chuvas, o chão cobria-se de flores miúdas e de verde. A geada
abandonava as ervas dos passeios de terra e os telhados das casas. A Natureza renovava-se
num êxtase de cores pelos prados e as crianças viviam mais felizes, perdendo-se
no meio de corridas e gritos. A roupa branca esvoaçava nos varais improvisados
de rua, alguma ficava a corar ao sol nos arbustos, espingalhada de vez em
quando, com água de um alguidar, pelas mãos diligentes da avó, para que nunca
secasse. A roupa era lavada no grande tanque de cimento que servia para os meus
banhos, quando o tempo começava a aquecer. Os carros de rolamentos voltavam à
rua, precipitando-se a grande velocidade pelas descidas…
Sente-se o cheiro a mirra e a
incenso, à medida que o padre abana o incensório na direção dos ramos que
levamos à igreja para benzer. A procissão estende-se a perder de vista. Fazemos
vénias no meio de oliveira, alecrim, louro, palma, flores e muita cor. Na missa
cantamos e nos momentos de silêncio e recolhimento há o respeito em que se pede
saúde, paz para o mundo e perdão dos pecados. Há fé nos rostos, algumas
lágrimas, esperanças e sorrisos. Harmonizamo-nos. Deus é só um e é para todos.
No Domingo a seguir
apanhávamos hastes de ramos de árvores e flores que desfolhávamos para pôr nas
entradas das casas. O padre, assim, sabia que podia entrar ali com a cruz para
beijarmos. Ouve-se a sineta ao longe, há quem tente adivinhar se está longe ou
perto, ou mesmo em que casa já está. Em cima da mesa havia uma laranja, em cima
dela cinco escudos e um envelope branco com dinheiro para a igreja. Alguns
doces. A toalha era branca e de renda, daquela que a mãe fazia nas tardes
longas de domingo. Muitas pessoas acompanhavam o padre e iam de casa em casa,
onde se partilhava bebida e comida. O bairro vestia-se com as suas melhores
roupas para celabrar a Ressureição de Cristo e das almas.
Era um tempo de interação e
amizade em tempo real, de beijos e abraços, de bom-dia, de desculpe, de
obrigado e de até já.
Que não se percam os valores!
A Páscoa, que antes era uma festa que envolvia toda a comunidade, deixou de ser, infelizmente, aquilo que era, restando apenas parcos vestígios. O mundo mudou, e de que maneira.
ResponderEliminarUma Feliz Páscoa, Graça :)
Obrigado, beijinhos
EliminarDoce Páscoa e um abraço com voto de boa semana.
ResponderEliminar:)
Obrigada, boa semana :)
EliminarTão visual este seu texto, que me pareceu estar a ver cada um dos pormenores que relata. Belíssimo!
ResponderEliminarDesejo que tenha tido uma boa Páscoa.
Uma boa semana com muita saúde.
Um beijo.
Obrigada, Graça! Um beijinho, boa semana
EliminarO importante mesmo é que não se percam os valores, como diz no seu magnífico texto.
ResponderEliminarBoa semana, amiga Graça.
Um beijo.
Obrigado, beijinhos!
EliminarLembro-me da Páscoa ser assim, quer aqui na cidade, quer na aldeia da minha mãe, onde passei duas ou três Páscoas.
ResponderEliminarAs coisas mudaram tanto...nós hoje temos muito mais, materialmente falando, o que é bom, mas temos menos na relação e no tratamento uns com os outros; as pessoas são mais egocêntricas e pouco preocupadas com os que os rodeiam. Há uma falta de respeito pelos outros, que me enerva, e o mais gritante é que muitas vezes as pessoas não têm essa noção, acham que têm os seus direitos, mas nem se importam se esses direitos entram em conflito com os direitos dos outros.
Enfim, haja esperança num futuro com mais humanidade.
Beijinhos e um bom fim-de-semana:))
Eu também penso assim, mas, infelizmente, não sou tão otimista!
EliminarBeijinhos